terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Solidão

            Dezembro. Uma persistente e refrescante chuva de verão lá fora. Meus cigarros estão acabando. Ainda me restam dois, seis latas de cerveja, e uma longa noite insone pela frente. Estive escutando algumas músicas minhas, daquelas preferidas que tu não conhece. Terminou. Ficaste magoada, fiquei sozinho. Penúltima semana do ano. Faltando pouco para o Natal, data mais sinistra.
            Fumo o penúltimo desta noite. Sem um pila no bolso pra comprar mais. Sem guarda-chuva, acho que a madrugada será propícia para caminhar sozinho por aí, me re-acostumar sozinho. Escrevo enquanto vejo os pingos caírem na janela, e sinto o vento leve entrar. Sinto o vento levar embora o aroma de cigarros desse quarto. Peço que leve embora teu cheiro também. Peço que leve embora alguns fios de cabelo que encontrei no travesseiro ao lado.
            Ainda é cedo, enquanto não for tarde. Não irei dormir. Decido ir trabalhar sem sonhos mesmo.
            Dezembro. Todos felizes, em família. Eu aqui. Sozinho, como sempre. Completamente estranho e alheio a tudo isso.  Não me lembro de ter passado algum natal feliz. Não me lembro de alguma passagem de ano feliz. Ou acompanhado. Nos últimos tempos, tenho visto que por mais que eu queira, sempre fico sozinho. Prefiro me sentir culpado, é menos trabalhoso que procurar culpados. É mais fácil amargar sozinho a dor. É mais leve sentir a solidão sozinho. Solidão a dois não deveria existir. Fico pensando como será minha ceia. Possivelmente algum lanche. Depois sairei, irei pra um bar encher a cara de uísque e tentar esquecer o que sempre me volta a mente quando acordo. Estou só. Posso ir e voltar quando quiser, ninguém irá perguntar nada. Como se isso fosse bom. Como se isso fosse realmente bom. Como se o que eu mais precisasse não fosse de alguém se preocupando comigo.
            Dezembro. Tento te odiar com todas as minhas forças. Com as poucas que ainda me restam, não consigo mais nem lutar contra a solidão, velha amiga.  Não consigo odiar ninguém.  Sei que não há nada nem ninguém que deva ser culpado, as coisas são como elas são. Como devem ser. E eu achando que poderia mudar alguma coisa nisso tudo. O único enfeite natalino nesse quarto é uma bola, daquelas das árvores, pendurada na tranca da janela. Uma vermelha, que tu roubou na árvore que fica no saguão do prédio. Até quando ficarei sozinho? Até quando eu vou me auportar, antes de brigar comigo mesmo e me mandar à merda?
            Dezembro. Termine, por favor.
            Limpo o cinzeiro cheio e me preparo pra sentir de novo. Como se eu pudesse descrever em palavras tudo que sinto. Sinto muito, B. Mesmo. Não queria que tivesse sido assim. Eu posso fazer melhor. Só não fiz.
            A chuva parou por um tempo, e vou à janela. Sopra um vento quase frio, o que me leva a pensar em talvez colocar alguma camiseta.  Estou emagrecendo. Minha mente não responde mais com a mesma força e meus sentimentos tem sido uma profusão embriagada de confusão. Por cinco minutos me considero livre e então me volta a cabeça que estou preso à solidão. Vinte e dois anos de solidão. Taí um bom nome pra um novo livro, não acha, Gabriel García Marquez?